Autor | Gilberto Fraga, sócio do escritório Fraga, Bekierman & Cristiano Advogados |
Publicação | JOTA |
Com grande alegria e certa preocupação, recebi o convite do JOTA para transmitir a um jovem advogado tributarista breves apontamentos sobre essa nobre e cada vez mais complexa função de advogar na área tributária no Brasil, principalmente nesse momento tão conturbado e difícil como o atual, em meio a uma crise ética, política e econômica singular, que torna incerto o futuro da República.
Diante da sanha arrecadatória de um Estado perdulário, devastado pela corrupção, com governantes que, regra geral, gastam o que não têm e deixam de prestar dignamente serviços essenciais à população como saúde, educação e segurança, a função do advogado tributarista ganha contornos épicos e, sem dúvida, revela-se como fundamental salvaguarda para aqueles que efetivamente sustentam a máquina, pagando tributos, gerando riquezas e produzindo emprego contra os desmandos governamentais.
Pois bem, o jovem advogado deve saber que o caminho é árduo e exige disciplina e criatividade. Para enfrentar esse desafio, ele deve, antes de tudo, dominar o Sistema Tributário Nacional tal como previsto na Constituição e no Código Tributário Nacional, identificando princípios, campos impositivos, peculiaridades dos tributos e suas espécies, e conhecendo a fundo as limitações ao poder de tributar e as normas gerais de direito tributário. Esse é o ponto de partida, mas a estrada é muito longa e exige conhecimento multidisciplinar, eis que o Direito Tributário dialoga com diversos outros ramos do Direito e com outras áreas do conhecimento humano.
Exatamente por isso, desde a faculdade, sempre dediquei – religiosamente – uma a duas horas por dia para o estudo de matérias relacionadas a contabilidade, economia, história, direito constitucional, civil, processual, administrativo, penal, empresarial. É um hábito fundamental que permite navegar pelos mares revoltos desse “manicômio tributário”, como um dia assim referiu Alfredo Augusto Becker.
Sempre trabalhei com contencioso tributário (judicial e administrativo) o que me proporcionou emoções as mais interessantes. O cidadão ou a empresa quando se veem ante à possibilidade de perder ou ver reduzido substancialmente seu patrimônio, através de um lançamento tributário equivocado, fraudulento ou calcado em regra ilegal ou inconstitucional, perdem a tranquilidade e seu destino estará atrelado ao sucesso do trabalho da sua defesa. A responsabilidade do advogado, portanto, é enorme.
Hoje em dia, sobretudo após o advento do Novo Código de Processo Civil de 2015, é absolutamente indispensável que o advogado tributarista (que trabalhe ou não com contencioso), tenha conhecimento da jurisprudência. Isso porque, para atender a garantia da razoável duração do processo e da isonomia, o legislador criou o microssistema de julgamentos repetitivos, inclusive nos tribunais estaduais e nos tribunais regionais federais, com efeito vinculante a todos os órgãos judiciais com competência para julgar a mesma matéria. Por isso, a leitura dos informativos e a necessária ciência dessas decisões abriu uma nova era no direito tributário e somente sobreviverão aqueles que estiverem atualizados sobre elas.
Aliás, sobre essa questão dos julgamentos repetitivos, certamente se sobressairão aqueles advogados que tiverem habilidade e talento para levar a efeito o distinguishing, isto é, que conseguirem demonstrar que a causa sob seu patrocínio não se enquadra no precedente firmado em regime repetitivo.
O advogado de contencioso deve estar presente nos tribunais. Deve conhecer a formação dos julgadores e os valores da região em que atuar. O despacho dos memoriais antes das sessões de julgamento é fundamental, pois é ali que o seu trabalho adquire voz, sentimento, alma. Muitas vezes, é nessa ocasião que se consegue transmitir ao julgador a boa-fé e a credibilidade do advogado, o “ponto da causa”, os efeitos sociais e econômicos que poderão advir da decisão.
Se a oratória for um dom do advogado, ótimo, muitas portas se abrirão para ele. Caso contrário, deve procurar um profissional especializado que o treine e o prepare para as diversas situações em que deverá ser ouvido em público. Já a redação é o cartão de visita do advogado. Seu texto dever ser simples, objetivo, conciso e elegante. O mundo atual não autoriza mais o estilo rebuscado e prolixo. Não se tem mais tempo para isso.
É interessante ao advogado associar-se a alguma entidade focada em direito tributário para enriquecer sua rede de contatos e experimentar a troca de experiência com outros colegas. No meu caso, dedico boa parte do meu tempo à Comissão de Assuntos Tributários da OAB-RJ, onde tenho a honra de exercer a função de Vice-Presidente. Na Ordem, temos a oportunidade de dialogar com as autoridades fazendárias sobre assuntos atuais e de interesse da classe, além de promover debates de absoluta relevância com advogados públicos e privados, magistrados e membros do Ministério Público.
O acompanhamento de projetos de lei de assuntos relevantes em matéria tributária também é de extrema relevância para o advogado, que, desse modo, antecipa estratégias de atuação e previne seu cliente sobre questões que podem trazer impacto relevante em sua atividade.
Enfim, o Direito Tributário é apaixonante e exige do advogado um esforço e dedicação singulares eis que a legislação é dinâmica e acompanha passo a passo os interesses do Erário. Manter-se atualizado é algo que demanda disciplina incomum, e é certo que o que bom combate, mais do que tudo, exige do advogado é coragem! Boa sorte a todos!